Pará registra quase 5 mil internações por quedas de crianças nos últimos três anos, aponta Sespa
Somente no ano passado, foram 1.671 hospitalizações por conta desses acidentes
Quedas de crianças de 0 a 9 anos resultaram em 4.674 internações no Pará entre 2022 e 2024, como apontam dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sespa). Somente no ano passado, foram 1.671 hospitalizações por conta desses acidentes. Em 2023, foi registrado um total de 1.730 e 1.273 no ano de 2022, ainda de acordo com o balanço da Sespa, baseado no Sistema de Informações Hospitalares (SIH/DATASUS). Esses números acendem alertas para os cuidados redobrados no dia a dia, segundo médicos da área.
O ortopedista pediátrico Raul Boettger, de Belém, explica que a maioria dos casos de traumas em crianças são do tipo de baixa energia. E ele lembra, ainda, que a complexidade da internação vai variar caso a caso - sempre com avaliação médica. “Por exemplo, numa queda durante uma brincadeira, a lesão mais comum é a contusão óssea, que muitas vezes vem com edema ósseo associado, sem ruptura do osso - o que caracterizaria uma fratura. Certamente há diferenças com a idade”, explica o especialista.
Boettger lembra, também, que, ao contrário de crianças com idades mais elevadas, as mais novas possuem ainda mais chances de quebrar algum osso em caso de quedas. “As crianças menores têm mais risco de sofrer fraturas que acometem a cartilagem ou fraturas por compressão, mais difíceis de diagnosticar, enquanto as crianças maiores, muitas vezes envolvidas em traumas esportivos, costumam apresentar fraturas mais desviadas e mais sérias”, reforça o ortopedista.
“E os principais sinais para observar [necessidade imediata de atendimento] são: a presença de uma deformidade grosseira no membro, como, por exemplo, a deformidade em ‘s’ que ocorre em algumas fraturas do antebraço e o desvio para fora, comum em fraturas de dedo. O inchaço muito rápido e doloroso também é um sinal de alerta, e é comum em fraturas do cotovelo e do joelho. E qualquer alteração de cor, como palidez ou escurecimento; sensibilidade, como dormência ou formigamento, ou movimento - incapacidade de movimentar os dedos ou a articulação”, completa o médico.
Sintomas
Ainda com relação aos sinais e sintomas dos traumas, o ortopedista alerta que "as fraturas sem desvio ou minimamente desviadas podem se manifestar com relativamente poucos sintomas e não serem óbvias após o trauma”. “Nestes casos, a dor é bem localizada, não passa após algumas horas, como ocorre com a maioria das contusões, e, quando é nos membros inferiores, a criança não tenta apoiar o membro corretamente", completa o médico.
“Para os traumas em membros, todas as fraturas cirúrgicas precisam ser internadas para serem fixadas o mais breve possível. Mesmo algumas fraturas ou lesões de tratamento não cirúrgico podem requerer internação para observar a circulação e vascularização do membro, isso é mais comum em algumas fraturas do cotovelo, antebraço e perna. As fraturas expostas também, pois é necessário completar um período de antibiótico intravenoso”, observa, ainda, Raul Boettger.
Cirurgia
Ainda que os cuidados médicos sejam necessários para todos os casos, a necessidade de cirurgia depende da complexidade da fratura, ainda de acordo com o ortopedista: “A indicação de cirurgia dependerá do osso, do grau de desvio e da idade da criança. Em geral, fraturas que comprometam a articulação, a cartilagem de crescimento ou que ocorram em crianças maiores e adolescentes têm mais chance de necessitar de cirurgia, porque a chance de sequelas é maior. As localizações mais preocupantes são o número, próximo à articulação do cotovelo, e o fêmur, próximo à articulação do quadril”.
“E um dos maiores problemas que podem ocorrer após quedas é o dano à cartilagem de crescimento de um osso, mais comumente o fêmur ou a tíbia. Essas lesões podem se manifestar semanas ou meses após um trauma, através de um distúrbio de crescimento do membro. A lesão ligamentar em crianças é comum em traumas esportivos, mas, no geral, são lesões menos graves e com menos indicações cirúrgicas do que em adultos”, comenta, também, o médico.
Susto
As férias em família no interior do Pará se tornaram um episódio de susto para a advogada Paola Leão Delgado, de 30 anos. A filha dela, Lara Leão, hoje com 12 anos, sofreu uma fratura na perna ao pular de um barco quando tinha 8 anos - mesmo com todos os cuidados da família. O acidente ocorreu em Cametá, enquanto a família visitava uma prainha formada no meio do rio. “A Lara foi pular do barco no raso e a perna virou, o que acabou causando a fratura. Não houve complicações, tirando o fato de que estávamos no interior”, relembra.
Diante da situação inesperada, Paola admite ter ficado em choque. "E lá [onde estava] só havia um hospital particular na época e que estava sem a máquina de raio-x, então corremos para a UPA. Paralisei. Meu sogro correu e carregou ela até o barco. Voltamos correndo para a cidade para buscar ajuda médica", diz. O diagnóstico foi confirmado assim que chegaram ao hospital. "Ela começou a gritar de dor e logo fez um ‘calombo’ no local onde fraturou, então não pensamos duas vezes em correr para o hospital", conta.
O tratamento exigiu adaptações na rotina da família. Durante três meses, Lara precisou se locomover com uma cadeira de rodas devido à imobilização da perna. "Tivemos que adaptar alguns móveis para facilitar a locomoção", conta Paola. Apesar da gravidade da lesão, a menina não precisou passar por cirurgia. "O médico disse que, por ser criança, as chances de o osso calcificar com o crescimento eram grandes, e foi o que aconteceu", explica Paola.
Lara também relata o episódio: “Foi um trauma muito grande na época. Eu era muito pequena. E, logo quando pulei, senti uma dor que nunca tinha sentido antes, eu me preocupei. Foi muito doloroso. Todo o caminho de volta de Cametá foi umas cinco horas traumatizante. Todo esse processo serviu de aprendizado para eu escutar mais a minha mãe e tomar mais cuidado com tudo isso. Tive que abdicar de várias coisas que eu gostava. Fiz fisioterapia”, destaca ao relembrar que paralisou atividades como o balé.
Totalmente recuperada, Lara e a família mantêm um cuidado extra para evitar novas quedas. "Agora, tem muita cautela na hora de pular de qualquer lugar, pois se lembra de tudo o que passou", diz a mãe da criança. A avó de Lara, a administradora Mônica Leão, 52, também conta os cuidados: “A gente orienta que ela evite estar pulando e correndo, alguma atividade que seja prejudicial para essas quedas. Uma coisa que eu acho perigosa é ir nesses brinquedos de parque”.