Jean Bitar é o único hospital da região norte a realizar atendimento às pessoas trans
A primeira cirurgia foi realizada em 2019 e até agora 19 cirurgias já foram realizadas
Por meio da luta e reivindicação da população transexual conquistas foram alcançadas na questão da saúde pública, como o ambulatório transsexualizador, que dá suporte às pessoas em transição de gênero com: hormonioterapia, atendimento psicológico e até as cirurgias de readequação. O Hospital Jean Bitar (HJB) é o único hospital público do Norte do país a ofertar esses atendimentos a usuários transgêneros. No Ambulatório do HJB há 38 homens trans e 26 mulheres trans, totalizando 64 pessoas cadastradas.
Ryssia Braun, endocrinologista do hospital relembra que o laboratório começou com a hormonioterapia e depois entraram as cirurgias mas que a porta de entrada para esses serviços é a Unidade de Referência Especializada em Doenças Infecciosas Parasitárias Especiais (UREDIPE). "Eles vêm encaminhados da UreDipe, com acompanhamento psicológico e de assistência social e até com a hormonioterapia. Hoje realizamos no HJB a mastectomia (retirada da mama), a ooforectomia (retirada dos ovários) geralmente realizada junto com a histerectomia (retirada do útero) do homem trans e, também no caso da mulher trans, coloca-se as próteses mamárias. As outras cirurgias ainda não são realizadas, mas estamos em busca de profissionais que as realizem", explica a médica.
André Santana Melo, cirurgião Plástico reforça a relevância do atendimento do Jean Bitar e afirma que no Brasil somente cinco hospitais estão credenciados para fazer as demais cirurgias de redesignação sexual. "Esta cirurgia só cinco hospitais no Brasil estão credenciados a fazer... Mas fazemos outras que são importantes para a qualidade de vida e autoestima da população trans, como a mastectomia masculinizadora e implantes de próteses", conclui.
A primeira cirurgia foi realizada em 2019 e até ao mês de outubro de 2021, 19 cirurgias já foram realizadas, sendo: 5 mastectomia, 10 implantes mamários e 3 pan histerectomia com anexectomia. Os usuários fazem acompanhamento prévio pela equipe multiprofissional, na UREDIPE, que inclui serviço social, psicologia, endocrinologia, fonoaudiologia e nutrição e, após acompanhamento com tempo mínimo de 2 anos, são encaminhados ao HJB para serem preparados por equipe multidisciplinar do Hospital, para a realização dos procedimentos cirúrgicos necessários.
De Parauapebas a Belém, a cabelereira Manuelly Soares, 31 anos, trimestralmente realiza acompanhamento no Jean Bitar. Ela conta que começou a hormonioterapia e teve apoio da família e do marido, com quem é casada há 8 anos e tem uma filha de 3 anos. "Comecei a hormonioterapia em 2019, a partir de um amigo que já estava em transição pelo ambulatório. Soube que era um atendimento bacana, com todo o apoio, me cadastrei e aqui estou. Fui encaminhada aqui para o Jean Bitar e a partir disso é quando começamos um novo processo, que é para as cirurgias, para a feminilização facial, colocação das próteses mamária, mas esta eu já fiz pelo particular. A minha busca é por outras cirurgia que aqui são disponibilizadas", revela a cabelereira.
Parauapebas concentra a maior parte dos pacientes atendidos pelo hospital
A ONG Frente de apoio e inclusão das pessoas transgêneros do Pará (FAIT), fundada há 4 anos em Parauapebas pelo pedagogo Marcos Alister, 30 anos tem o objetivo de orientar e auxiliar as pessoas trans que buscam o atendimento em Belém. Marcos conta que faz o tratamento de hormonioterapia e acompanhamento social há 2 anos e também aguarda a sua vez para realizar a cirurgia. Por saber que outras pessoas também precisavam de acesso aos tratamentos, auxilia 26 pessoas que fazem tratamento no Jean Bitar.
"Por meio do tratamento fora do domicilio (TFD), que eu consegui encaminhar essas pessoas. De três em três meses viemos para Belém, quando o tratamento já estava em andamento. A FAIT promove o acesso à informação. A gente não precisa de novas políticas públicas, precisamos do mesmo acesso. Porque o mesmo acesso a saúde que uma pessoa heterosexual cisgênero precisa, a pessoa trans, mesmo com a suas particularidades, precisa e temos esses direito garantido", explica.
A assistência à população trans é estruturada pela Atenção Básica e a Atenção Especializada. A Básica é onde ocorre as avaliações médicas e encaminhamentos para tratamentos e áreas médicas mais específicas e individualizadas. Já atenção especializada, tem a parte ambulatorial com acompanhamento psicoterápico e hormonioterapia e a hospitalar, com a realização de cirurgias e acompanhamento pré e pós-operatório.
Manuelly diz que esses serviços ofertados só ajudam a população a ser quem sempre foram, que as pessoas trans sabem desde sempre e precisam da comunidade familiar e suporte dos amigos para passar por esta transição e faz um apelo às famílias.
"Eu sempre fui mulher, eu já nasci mulher, só que uma menina no 'corpo de um menino'. Na sociedade que vivemos, ser homessexual é mais fácil que você ser transexual. Quando eu me assumi já estava casada, tinha 23 anos e falei com meu esposo que eu não conseguia viver mais aquele universo que não era meu... Deixei meu cabelo crescer, fui colocando a minha feminilidade para fora. Tive apoio dos meus pais, meus irmãos também. Se você tem uma pessoa trans na família, procure ajudar. Saber o que é a transgeneridade. Meninos e meninas trans, não desistam de ser quem vocês sempre foram. Se informem, aqui tem toda a estrutura. Agradeço imensamente a equipe dos profissionais, capacitados para atender a gente. E quem não sabe, que procure direitinho, é de atendimento rápido. A gente só tem a ganhar, buscando ser quem sempre fomos", finaliza.