Hospitalidade é uma marca registrada do belenense
Moradores de Belém contam o que os motiva a serem gentis e calorosos com pessoas de outros lugares
Moradores de Belém contam o que os motiva a serem gentis e calorosos com pessoas de outros lugares
Há séculos, viajantes têm registrado suas impressões sobre as peculiaridades de Belém, a cidade encravada no coração da floresta amazônica. Desde os primeiros portugueses que estabeleceram as bases do vilarejo fortificado que deu origem a Belém, passando pelas contribuições dos suíços Emílio Goeldi e Jacques Huber — botânico e um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IPHAN) em 1900 —, décadas mais tarde, em 23 de maio de 1927, o poeta modernista Mário de Andrade escreveu em seu diário de viagens: “Em Belém, o calorão dilata os esqueletos e meu corpo ficou exatamente do tamanho de minha alma”. Em 2025, esses ecos do passado dialogam com novos olhares de quem chega para desvendar a cidade e encontrar, no carinho do belenense, uma acolhida marcada pela tradição e hospitalidade.
Em 2009, quando ainda era estudante do curso de História na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, o professor carioca Nelson Marques Júnior, 39, veio para Belém para apresentar um trabalho da graduação durante um congresso na capital. Passou 15 dias na cidade, o suficiente para se apaixonar e sonhar um dia que ali seria o destino do seu lar, doce lar. “Eu conheci alguns bairros como Marco, Terra Firme e Guamá e coloquei na minha cabeça: depois que eu fizer mestrado e doutorado, Belém será um dos locais onde eu vou fazer uma carreira longa, por conta da vida cultural, museus, história”, relembra o professor, natural de Nilópolis, Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, e onde nasceu a escola de samba Beija-Flor.
Catorze anos depois, ele veio de mala e cuia com a esposa e o filho para Belém. Passou no concurso para professor da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA). Mas não foi apenas o centro histórico que fez o coração do carioca bater mais forte. A amabilidade do povo paraense também entrou na lista dos requisitos que o faria atravessar os quase 2.500 Km de distância que separam as duas capitais.
“Belém foi uma cidade que me acolheu muito bem. Eu gosto muito da relação interpessoal que eu tenho com as pessoas aqui. Elas são muito solícitas, muito abertas para conversar e receber as outras. Quero ficar por aqui e construir uma história. Não tem intenção de sair de Belém, não”, confessa Marques.
A hospitalidade é um cartão de visitas do paraense. Receber bem, ser gentil com “estranhos” e manter acesa a chama do calor humano fazem parte da marca hospitaleira de quem vive aqui. O contador Wagner Braga, 46, atribui à compreensão da lei do retorno o que pode ser uma das razões para que os moradores sejam mais receptíveis com outras pessoas, não importa de onde vieram.
“O povo paraense tem essa característica de ser acolhedor, educado. E é legal tratar as pessoas da maneira como a gente gostaria de ser tratado. Eu acredito que, fazendo dessa forma, a gente atrai uma coisa boa pra nós também”, afirma Braga.
A atendente Adriana Duarte, 50, trabalha em uma lanchonete no Terminal Rodoviário de Belém. Tem contato com turistas diariamente. E afirma que o carisma é um traço natural do paraense que, segundo ela, não é possível identificar em pessoas que estão do outro lado das fronteiras que delimitam o Pará.
“Nós somos um povo de cultura carismática. A gente chega em outro estado, em outro lugar, o povo não recebe as pessoas como deveria receber. Eles se fecham, não dão sorriso, não dizem bom dia, não dão tratamento específico para que a pessoa possa se sentir bem e voltar de novo”, conta Duarte.
De acordo com estimativas do Ministério do Turismo, são esperados mais de 50 mil visitantes durante os principais dias da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 30) que será realizada de 10 a 21 de novembro, aqui na capital. Para além das obras que estão a todo vapor em diferentes pontos da cidade, Belém se prepara para fazer jus à fama de povo hospitaleiro.
Para Nelson, a receptividade deve ser tirada de letra, já que o paraense está acostumado a receber pessoas de outros lugares por conta dos grandes projetos instalados na Amazônia. “Você tem gente de muitos estados aqui que veio para trabalhar em multinacionais, e aí eu acho que, por ser uma capital antiga e uma cidade em que muitas pessoas vêm de outros países e outros estados morar aqui, o acolhimento se encaixa muito bem”, explica o carioca.
Wagner diz que percebe o quanto as pessoas têm se preparado para cativar e tratar os visitantes dos quatro cantos do mundo do melhor jeito paraense de ser. “Eu estou vendo a cidade se modificar totalmente, pessoas se preparando para receber os turistas, se qualificando para falar um idioma novo, para receber da melhor forma o povo que vem de fora. E esse pessoal vai sair daqui não apenas com boas ideias para conter os avanços das mudanças climáticas, mas também com uma ótima impressão a nosso respeito”, afirma o contador.