Família de rua faz casinha para fugir da violência e da chuva
Imóvel improvisado foi erguido na arquibancada da praça Waldemar Henrique. Cola de sapateiro e doações são outras medidas necessárias para sobreviver
Uma casinha improvisada foi montada, na arquibancada, da praça Waldemar Henrique, em Belém. Lá, cinco pessoas, de uma família em situação de rua, fizeram daquela estrutura precária um lar. Um abrigo contra a chuva e a violência. Para seguir resistindo ao desafio diário de viver nas ruas, a família vive de doações, do que encontram no lixo e da cola de sapateiro (que tira a fome).
Rafael Sarges Rodrigues, de 30 anos, conta que a família se abrigou no barraco há quase três semanas. Eles vinham sendo roubados com frequência e ficando sem o pouco que tinham. Na guerra pela sobrevivência, nem sempre há senso de cooperação. Nem pequenos bicos estão aparecendo. Faz quase 10 anos desde a última vez que o jovem trabalhou como destopador numa serraria.
Na tarde desta segunda-feira, apareceu comida. Na feira do Açaí, conseguiram água que sobrou das polpas batidas, farinha e restos de peixe e legumes. Fizeram um cozido em uma lata retangular (de tinta ou manteiga). Mas isso não é sempre. Quando a fome aperta e a sorte é ainda menos presente, cada um reúne os trocados que conseguir e compra uma garrafa de 200 ml de cola de sapateiro. Custa R$ 8,50, dá para enganar os cinco cérebros e ficar sem se alimentar o dia todo. Valor que mal garante uma refeição digna para uma pessoa. É o que leva muitas pessoas ao crack.
Rafael é descendente da etnia indígena Tupã, de Altamira. Só que foi criado em Belém. O último contato com a família original foi em 2018, perto do Círio. O pai dele, pouco antes de morrer, o levou à aldeia. Só resta a ele um irmão, que o deu um pequeno terreno no Tenoné. A grande companhia é a quase esposa, Bia Rodrigues, de 25 anos, que nem consegue falar direito. Mas já adotou o nome do companheiro. O casal divide os restos de um sofá que virou a cama no imóvel improvisado.
Ainda há sonhos de voltar a trabalhar em serrarias, mas não de voltar a estudar e fazer curso superior. Nem acredita mais que poderá conquistar tal coisa. "Estamos abandonados, sem ajuda nenhuma. A gente tem que sobreviver. Quem cuida são voluntários de médico, pessoal que traz comida e o pessoal da Marinha. Se pudessem ajudar a levantar minha casa no Tenoné e arranjar emprego, não ficaria mais assim", diz o jovem.
Belém tem 822 pessoas em situação de rua
Em nota, a Fundação Papa João XXIII (Funpapa) informou que o último estudo da população de rua foi realizado em 2015 e 2016, identificando 822 pessoas nessa condição.
Sobre a situação da família e da casinha da praça Waldemar Henrique, a Funpapa diz que "...nesses casos, a política de assistência apresenta o Serviço Especializado de Abordagem Social da Funpapa, que trabalha com aproximação pedagógica ao usuário, levantando dados pessoais como também local de origem. A partir desse primeiro contato, são apresentados os serviços da fundação, como Centros Pops e Espaços de Acolhimento".
Caso a pessoa deseje sair das ruas, explica a Funpapa, "...é apresentado o fluxo de atendimento. O primeiro atendimento é no Centro Pop e depois nos Espaços de Acolhimento com acompanhamento psicossocial e interferência da rede intersetorial (saúde, educação e habitação)".
A Funpapa conclui a nota dizendo que "...vem acompanhando a situação da pessoa que se encontra na praça Waldemar Henrique. Trata-se de um senhor idoso que apresenta quadro de epilepsia e crises convulsivas constantes. A família reside no bairro da Terra Firme. A equipe de abordagem, informou que ofereceu os serviços prestados pela assistência e ofereceu acolhimento, mas ele foi resistente em não querer ir naquele momento. Por fim, a Funpapa ressalta que nesta semana estará retornando ao local para dar continuidade ao protocolo de atendimento".
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