Estudantes com deficiência: saiba como fazer para garantir a aprendizagem na escola

Educação inclusiva ainda é um grande desafio da família e escola em Belém

Eduardo Rocha
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A inclusão, de fato, de estudantes com algum tipo de deficiência em escolas públicas e particulares ainda é um desafio a ser vencido por muitas famílias em Belém, embora a situação venha evoluindo favoravelmente mediante a mobilização de pais, mães e responsáveis. Como exemplo, a contadora Josiane Paiva Portugal Pena, 43 anos, casada, mãe de três filhos, incluindo a Maria Eduarda Pena, com deficiência intelectual e física, cursa o 8º ano do Ensino Fundamental em uma escola pública em Belém. Para Josiane, uma das principais barreiras para o estudante com deficiência em Belém é a falta de um mediador em sala de aula em escolas públicas e particulares para assessorar esse aluno ou aluna. 

Ela destaca que, a cada mil matriculados, somente 15% têm um mediador, e muitas famílias precisam pagar para que o filho não fique sozinho ou para que não deixe de ir à escola. Esse levantamento foi feito pelos próprios pais reunidos no Movimento da Inclusão (Movi-PA), do qual ela faz parte.

“Sem  o mediador, o  aluno não consegue acompanhar a turma na mesma intensidade, muitos não têm ainda a escrita, uma escrita ágil, e os mediadores acabam, de certa forma, ajudando a escrever e até a explicar a matéria, porque muitas vezes também o professor regente para uma turma de 40 alunos não consegue explicar a matéria para toda a turma e mais para esses alunos da educação inclusiva”, destaca Josiane. Essa mãe pontua que em geral em quase todas salas existe mais de um deficiente e ressalta que, de acordo com a legislação vigente, quando entra um aluno com deficiência, cinco alunos da classe considerados típicos precisam ser demandados para outra sala, mas isso não ocorre. “As salas acabam ficando inchadas mais e mais”, salienta.

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Outro desafio é que, em virtude da falta de material pedagógico adaptado, muitos estudantes ficam sem fazer nada em sala de aula, sem aprender conteúdos. Muitas vezes, na rede pública, estagiários são utilizados como mediadores de forma improvisada, sem atender os estudantes a contento. Os direitos dos estudantes com deficiência são garantidos no artigo 54, inciso 3 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na Lei Brasileira de Inclusão (LBI) e normativas do MEC. 

A inclusão não ocorre, infelizmente; falta acontecer no âmbito das escolas públicas e privadas, em todas”, afirma Josiane, observando que  muitas escolas em Belém não oferecem o Atendimento Educacional Especializado (AEE), uma sala exclusiva para alunos com deficiência no contraturno  para serem trabalhadas as dificuldades específicas do estudante, previsto em lei. A mobilização das famílias é fundamental para garantir a educação aos estudantes com deficiência, como enfatiza Josiane Pena.

Como referência sobre o trabalho do mediador, Wanderson Soeiro, que atua nessa função em uma escola particular, destaca: “O trabalho é acompanhar essas crianças mediando as atividades coordenadas pela professora regente, adaptando essas atividades para melhor compreensão; esse acompanhamento é muito importante, pois toda criança aprende de um jeito e as crianças atípicas também”, pontua.

 

MPPA orienta famílias sobre direitos dos estudantes

A promotora de Justiça de Defesa das Pessoas com Deficiência  e dos Idosos do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), Socorro de Maria Pereira Gomes dos Santos, explica que a cobrança de laudos médicos para efetivar a matrícula ou garantir a permanência de estudantes com deficiência nos estabelecimentos de ensino contraria várias normas, dentre elas a Lei Federal nº 7.853, de 1989, que trata da inclusão de pessoas com deficiência. Portanto, essa cobrança é ilegal. 

Em lugar do laudo, como salienta, seria mais interessante a possibilidade de que os clínicos que tratam da pessoa com deficiência realizassem uma nota clínica para desenvolver um diálogo com os educadores,  para se construir conjuntamente estratégias em prol de cada criança que encontra barreira para estar na escola

Como explica a promotora Socorro Santos, deficiência apresenta-se como o resultado da interação de sujeitos com as diversas barreiras existentes, não limitadas à falta de rampas ou elevadores. Por exemplo, a presença ou ausência de um intérprete de Libras pode definir o tamanho da barreira que uma criança ou adolescente surdo enfrentará ao ser atendido numa unidade escolar ou numa unidade de saúde ou num serviço público. 

Além da Constituição Federal, o ECA e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o Plano Nacional de Educação e a LBI garantem a matrícula à pessoa com deficiência esse direito fundamental ao cidadão. Dessa forma, qualquer escola pública ou particular que negar matrícula a um aluno com deficiência comete crime. Assim, os pais podem ficar atentos a situações (prática abusiva) no momento da matrícula, que caracterizam infração administrativa ou infração criminal. 

Como práticas abusivas mais comuns, como aponta a promotora, se tem: negar a matrícula de aluno devido à deficiência, com até se inventando uma desculpa ou justificativa (não tem mais vaga, não tem condições de atender àquele aluno); cobrar pagamento de  taxas extras ou valores diferenciados devido à deficiência ou até alegando possíveis necessidades educativas especiais; quando se obriga pais ou responsáveis a contratar profissionais de apoio escolar para acompanhar o aluno. Outra situação muito comum é a de serem impostas provas ou outros mecanismos de avaliação como laudos médicos que impeçam ou dificultem a matrícula de alunos com deficiência.

“Essa prática abusiva é muito fácil de ser detectada em algumas reclamações; eu cheguei para matricular meu filho, eu disse que ele tinha necessidades especiais, eles pediram um laudo, e eu estou com dificuldades para comprovar, e em razão disso começam a dificultar a matrícula ou a permanência desse aluno, criando uma barreira que ele efetivamente possa frequentar a escola normalmente”, destaca promotora Socorro.

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Penalidades

É prática abusiva obrigar pais ou responsáveis a permanecer na escola para acompanhar o filho portador de alguma deficiência. As sanções penais nesses casos constam da Lei 7.853, de 1989, artigo 8, inciso 1º, que diz: “Constitui crime punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa - recusar, cobrar valores adicionais, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau , público ou privado, em razão de sua deficiência”. No parágrafo 1º, está estabelecido que “se o crime for praticado contra pessoa com deficiência menor de 18 anos, a pena é agravada em um terço”.

Caso a escola não aceite matricular o aluno com deficiência, o primeiro passo dos pais ou responsáveis é buscar o diálogo com a coordenação escolar informando sobre os direitos desse estudante com deficiência. Caso a situação não seja solucionada, a família pode procurar um advogado ou usar os serviços da Defensoria Pública, para esse atendimento específico. Pode denunciar os fatos à Secretaria de Educação do Estado ou do Município ou ainda acionar um dos órgãos de controle mais próximo, que podem ser o MPPA, o Conselho da Criança e do Adolescente ou Conselho Tutelar.

O laudo médico para PCD é um direito, e é possível obter esse documento em hospitais e clínicas médicas. Também pode-se solicitar em uma unidade de saúde, via SUS.  A educação inclusiva avançou no Brasil, mas o desafio é promover adaptações para o desenvolvimento sócio emocional desses alunos, o que inclui  o preparo dos docentes e  ter um projeto pedagógico inclusivo. Para solucionar de forma coletiva as demandas, principalmente relacionadas ao Estado e Município, resolveu judicializar  a demanda e foi criado um fluxo administrativo com relação a essas duas esferas de governo, em que, antes de demandar o Judiciário, são adotadas medidas pré-processuais, envolvendo as escolas em questão e órgãos gestores educacionais. Essa prática, como observa a promotora,tem contribuído para um melhor atendimento das demandas.

 

Semec

A Secretaria Municipal de Educação (Semec) informa que, desde 2021, reativou o filtro da educação especial e inclusiva da rede municipal de ensino, que garante a matrícula de forma equitativa, ou seja, equilibrando a quantidade de alunos com e sem deficiência em sala de aula. A matrícula para este público é sempre realizada na primeira fase da pré-matrícula e, caso o responsável não tenha o laudo médico na entrega da documentação na escola, o estudante será avaliado pela equipe multifuncional do Centro de Referência em Inclusão Educacional (Crie) Gabriel Lima Mendes para encaminhar a rede de apoio municipal.

O processo de matrícula na rede municipal ainda está aberto até 24 de maio, quando encerra o Censo Escolar. Até o momento, o Sistema de Informação em Gestão Acadêmica (Siga) matriculou 2.400 estudantes com deficiência. Este número pode ser alterado, porque a Semec acolhe este grupo de estudantes ao longo do ano. Em 2022, foram matriculados 2.011.

Na rede municipal, o estudante com deficiência assiste aula normalmente no horário de matrícula com o auxílio de um estagiário. No contraturno, recebe atendimento educacional especializado na Sala de Recurso Multifuncional, além do atendimento agendado no Crie, com um leque de programas envolvendo atividades educativas e culturais; de Libras e de atenção e formação aos pais. Hoje a Semec conta com 200 estagiários/mediadores (vinculados ao Nees), que auxiliam as escolas no atendimento aos estudantes com deficiência. A meta é dobrar esse número até o final deste semestre.

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Seduc

A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) informa que não precisa de laudo para a realização da primeira matrícula. Porém, para a efetivação da segunda matrícula, a condição é ser PCD (pessoa com deficiência), a fim de assegurar um melhor suporte pedagógico. “Na ausência de laudo, a rede pública disponibiliza um formulário que atesta a condição, tendo mais subsídios para a confirmação no serviço de atendimento educacional especializado.

A Seduc informa ainda que em 2022, foram matriculados 13.725 alunos. Já em 2023, 4.721 foram matriculados, até o dia 15 de fevereiro. Já em relação ao atendimento, dependendo da necessidade do aluno, ele pode receber um suporte específico dentro da sala de aula, com apoio dos profissionais da educação especial.

 

Particulares

O Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Estado do Pará esclarece que há, nas escolas, alunos que são laudados e que não possuem laudo. A escola acompanha o desenvolvimento desse aluno, se ele tem uma progressão regular  ou se  precisa de acompanhamento individualizado. Não é possível afirmar que só aluno laudado é considerado aluno da educação especial, e a escola, a partir de suas avaliações, vai detectando as necessidades de cada aluno.

As escolas fazem o atendimento na educação especial a partir da avaliação individual do aluno para que seja preparado um plano educacional individualizado. A legislação fala em apoio educacional (o mediador é uma das nomenclaturas desse profissional), que deve ser disponibilizado, a partir da avaliação da escola, para garantir ao aluno todo o apoio necessário e isso depende de aluno para aluno.

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