“A Amazônia pode ser uma vitrine para o mundo de novas formas de se morar em floresta”. É o que afirmou, nesta quinta-feira (12), a pesquisadora do MIT Gabriela Bìlá. Ela participou, em Belém, do evento “Futuros Urbanos Amazônicos”, uma iniciativa inédita liderada pelo MIT Media Lab, em parceria com o Laboratório da Cidade, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPA (FAU-UFPA) e o Museu Paraense Emílio Goeldi.
O evento buscou integrar a sociedade na construção de uma visão de futuro para as cidades amazônicas, explorando como o diálogo entre tecnologias contemporâneas e conhecimentos tradicionais, especialmente no contexto do século XXI, em que o desafio climático exige soluções inovadoras e colaborativas, a contribuição do MIT com instituições amazônicas será um ponto central das discussões.
Pesquisadora do MIT e uma das articuladoras dessa iniciativa, Gabriela Bìlá contou que o que permeou a conferência foram as cidades da Amazônia, sendo Belém a primeira delas.
“Geralmente, quando a gente pensa na Amazônia, a gente pensa na floresta, e numa floresta não habitada por humanos. Mas, na verdade, para olhar o futuro dessa floresta, a gente tem que olhar para as cidades e para os humanos que habitam essa floresta”, disse a pesquisadora.
Ela comentou que o século XXI é um momento-chave para se pensar como as pessoas habitam esse planeta. “O Brasil é o país mais biodiverso do mundo. A gente tem a maior floresta tropical do mundo. É um celeiro de biodiversidade que, já há milhares de anos, tem sido habitada por milhões e milhões de povos indígenas que transformaram e esculpiram a floresta como a gente conhece”, observou. O tipo de cidade que se tem hoje em dia é um modelo muito importado da Europa, que causa impactos ambientais e social. “As favelas aumentando cada vez mais, as pessoas sem infraestrutura. Então, para a gente conseguir pensar na floresta hoje em dia, a gente tem que olhar também as cidades que estão nessa floresta”, completou.
Onde a ancestralidade encontra a tecnologia
Sobre quais seriam as cidades que podem existir fugindo desse modelo tradicional, Gabriela afirmou que essa é a “pergunta chave” desse trabalho: “É a nossa grande pergunta de pesquisa. A Amazônia pode ser uma vitrine para o mundo de novas formas de se morar em floresta. Como a gente sabe hoje em dia, a gente tem várias formas tradicionais de viver aqui que sobreviveram, que são os ribeirinhos, os quilombolas. Então a nossa ideia é como é que esses modos ancestrais de transformar floresta, junto com novas tecnologias, porque o mundo mudou, a gente tem cada vez novas coisas surgindo, como é que juntando esses dois tempos a gente pode criar uma nova forma de habitar. Hoje a Amazônia do Brasil tem um potencial gigantesco para ser um novo modelo para o mundo”, afirmou.
Esse formato atual, disse, já esgotou. “A gente sabe o tanto de desigualdade, de poluição, não é um modelo que está preparado para todas as questões climáticas que estão vindo. A gente já vive secas históricas, enchentes históricas, as pessoas não têm água na cidade. Como é que a gente pode viver na maior base hidrográfica do planeta Terra e as pessoas não têm água? Então, é um modelo que a gente sabe que faliu, mas isso não quer dizer que a gente tem que abandonar as cidades”, afirmou Gabriela.
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“Temos que voltar a olhar para os nossos rios”, diz arqueóloga do Museu Goeldi
A arqueóloga Helena Pinto Lima, pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi, também participou do evento. “Nós estamos juntos fazendo exercício de imaginar futuros alternativos, de imaginar como poderiam ser as nossas cidades amazônicas a partir de perspectivas diferentes”, disse.
"Aprender a partir de experiências passadas, experiências anteriores, o que poderiam ser as nossas cidades amazônicas no futuro”, contou a arqueóloga.
Ela disse que, como arqueóloga, anda muito pelos interiores da região. “Vejo que nós temos muito o que aprender dos povos antigos que habitaram a Amazônia. A gente vê modelos outros de urbanismo, modelos que comportaram sociedades complexas, socialmente complexas em integração com a natureza, integração com o ambiente de forma a co-construir essa biodiversidade que nós temos hoje”, explicou.
Helena Pinto disse que são muitos os desafios: de ordem da própria transformação energética a mudanças climáticas. “Voltar a olhar para os nossos rios, voltar a olhar e interagir e integrar com as nossas florestas talvez seja um bom caminho para a gente olhar para o futuro. Não estou olhando para o passado, enquanto arqueóloga. Estou pensando e imaginando o que pode ser um futuro viável para todos nós”, disse.
Crescimento informal
Kent Larson, diretor do City Science do MIT Media Lab - laboratório de pesquisa da escola de Arquitetura e Urbanismo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), também participou do evento. Ele disse que as comunidades informais tendem a crescer, já que boa parte do crescimento urbano é informal. “O que a gente está olhando, no nosso modelo de pesquisa, é que nessas comunidades geralmente produz-se pouco impacto ambiental. Mas, ao mesmo tempo, há pouca qualidade de vida”, afirmou.
“Então, como a gente pode melhorar a qualidade de vida dessas pessoas, mas sem imitar esse modelo que já existe, que é de um impacto ambiental muito sério. Como a gente pode juntar o melhor dessas comunidades informais, que nascem de uma forma orgânica, mas tendo infraestrutura, tendo qualidade de vida, tendo uma boa condição sanitária, educação. Mas sem a gente replicar esse modelo que a gente sabe que é muito pesado, que é caro, que gera asfalto, que é concreto e que mata a floresta. Como a gente pode unir a melhor das duas práticas”, disse.