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Maioria das encarceradas no Pará não tem o ensino médio

Pesquisa realizada em cinco casas penais mostra ainda que muitas delas estão presas porque não tiveram as mesmas oportunidades sociais

Luiz Cláudio Fernandes

Uma pesquisa realizada pela Defensoria Pública de Ananindeua em cinco casas penais da região metropolitana de Belém mostra que quase todas as mulheres não têm sequer o ensino médio completo. O estudo mostra ainda que mais de 70% delas estão encarceradas  por acusação de prática de tráfico de substâncias entorpecentes, quase sempre em posição de submissão e influenciadas pelos maridos, os principais envolvidos com o crime. 

A defensora pública Lisianne de Sá Rocha coordenou a pesquisa e explica que ela mapeou principalmente os perfis das detentas do CRF de Ananindeua, do CRF de Marituba e da Unidade Materno Infantil. A maior parte delas é jovem, tem filhos e completou o ensino médio dentro do cárcere. 

“A maioria está nessa condição pela prática do tráfico de drogas, que é um delito sem violência, e todas levadas a praticar por influência do namorado ou marido. Elas se envolvem nessa situação por amor, ou seja, não têm o perfil da delinquência”, explica a defensora pública. “O propósito é quase sempre ser parceira do namorado, que efetivamente está intencionado ao delito. Em 90% dos casos eu ouço o discurso ‘meu marido pediu pra guardar na minha bolsa ou em casa’, informa. 

“Elas não tiveram como desenvolver uma atividade laboral que tivesse sido minimamente digna, então direcionam para crime ou trabalho informal que remunera muito pouco. A atividade mais desenvolvida pelas mulheres é de empregada doméstica. Já pelos homens é o trabalho informal como ajudante de pedreiro ou auxiliar usando a força bruta, nenhuma atividade intelectual”, informa Lisianne. 

É preciso ver os encarcerados de forma humanizada 

Já o público masculino geralmente pratica crimes contra patrimônio, roubo, furto, e tráfico de drogas, o que também denota o perfil da hipossuficiência econômica, explica Lisianne. Para ela, a realidade das pessoas encarceradas deve ser vista de forma humanizada, pois o motivo do encarceramento é reflexo de uma sociedade desigual, onde as oportunidades não são iguais. “Para muitas dessas pessoas, o crime era a única janela disponível”, avalia.

A pesquisa mostra ainda que a grande maioria dos internos sofreu violência familiar ou foi rejeitada pela família. Por não terem condições de se sustentar, foram cedo para as ruas. “Diante dessas condições adversas fica difícil vislumbrar um futuro diferente da marginalidade. Esses indivíduos nunca foram considerados cidadãos, porque nunca tiveram acesso a políticas de educação, cultura, moradia e lazer. Esse direitos sociais nunca foram acessados, são indivíduos que sempre estiveram à  margem da sociedade. A segregação por meio de um processo judicial só veio legitimar a segregação que sempre esteve com eles”, explica Lisianne. 

Ainda segundo Lisianne, essas pessoas sempre sobreviveram com o mínimo. “Elas estão em um contexto social bastante desfavorável. Já no mundo do crime é muito mais fácil, pois as políticas públicas não chegam no ambiente em que essa pessoa mora, a periferia. Cria-se, então, nesses lugares, um Estado paralelo com outras regras de segurança e assistência social, onde quem manda é o líder da comunidade e não o governo”, contextualiza a defensora pública. 

“Não podemos nem falar em ressocialização, sendo que a maioria dessas pessoas nunca vislumbrou uma vida em sociedade, não fez parte da sociedade efetivamente. Qualquer um de nós que tivesse passado por um contexto desse teria o mesmo destino. Os que conseguem driblar esse destino são casos excepcionais”, pontua. 

Entre as cinco casas penais, a grande maioria dos homens tem apenas o Ensino Fundamental. Já as mulheres, quase todas chegam a completar o Ensino Médio na prisão. 

Projeto oferece uma segunda chance e remição da pena 

Nessas casas penais ocorrem as atividades de um projeto que foi conduzido pela Defensoria Pública ao longo de 2018 chamado "Reestruturando Caminhos Através do Saber Fazer”. “Contamos com a parceria da assistente social Emiko Alves, coordenadora pedagógica do projeto, que à época ocupava um cargo sobre gestão de projetos na Defensoria Pública,  e com a parceria de uma escola profissionalizante, de propriedade do advogado Kleber Gadelha”, explica. 

Fazíamos aplicação de um questionário básico para diagnose do perfil do interno/interna a fim de implementar políticas públicas de educação profissionalizante que  melhor se ajustasse ao perfil deles, mas que proporcionasse o incremento ou aprendizado de novas competências e habilidades, a fim de oferecer ferramentas para o mercado de trabalho, quando egressos do cárcere.

Na unidade materno infantil aplicamos oficina de reaproveitamento de garrafas pet. As internas produziram flores produzidas a partir da manipulação de garrafas pet, que foram encomendadas para ornar a Berlinda de Nossa Senhora no Círio de Marapanim.

No CRF de Marituba e no CRF de Ananindeua foi realizado curso profissionalizante de secretariado às internas.O curso de secretariado implicava nos módulos: recepcionista, telefonista, marketing, atendimento ao público, atendente de farmácia, almoxarife e agente de portaria. Além da certificação, a participação nos cursos e oficinas garante a remição de pena por trabalho/estudo de todas as participantes/concluintes.

 

Ananindeua