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Tambaqui: muito além da gastronomia, peixe é objeto de pesquisa

Gelatina do peixe é aplicada em produtos e pesquisadores da Amazônia realizam, de forma inédita, a clonagem do gene do hormônio de crescimento da espécie

Ize Sena | Especial para O Liberal

O Tambaqui (Colossoma macropomum), peixe nativo da região Amazônica, vem atraindo a atenção de pesquisadores, que investigam suas propriedades em laboratório e tem como resultados as descobertas de diversas potencialidades que vão muito além da gastronomia.

A obtenção de gelatina extraída a partir da pele do Tambaqui é uma das possibilidades de aplicação do peixe, que permeia as inovações tecnológicas das indústrias alimentícia e farmacêutica, como descobriram os pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

A pesquisa foi desenvolvida no âmbito do projeto “Ações estruturantes e inovação para o fortalecimento das cadeias produtivas da aquicultura no Brasil” (BRS Aqua), na busca de alternativas para redução dos resíduos de processamento de pescado. O projeto contou com o apoio financeiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Secretaria Nacional de Aquicultura e Pesca do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA).

Foram quatro anos de estudo até chegar ao resultado final. A pesquisa se debruçou a investigar soluções para um dos maiores problemas enfrentados pela expansão da cadeia produtiva de pescado: a quantidade de resíduo gerado durante o processamento. Com a intenção de contribuir para o fortalecimento do setor, o objetivo do trabalho foi estudar e desenvolver metodologias para o aproveitamento da pele de peixes, em escala semi-piloto, apresentando os aspectos tecnológicos dos materiais obtidos.

Para a extração de colágeno parcialmente hidrolisado (gelatina), as peles foram submetidas a pré tratamentos alcalino e ácido, seguidos de extração com água quente. Após as etapas de filtração, concentração, secagem e fragmentação, obteve-se um material seco e granular. 

“Foi possível obter gelatina com bom rendimento e características tecnológicas, com potencial de aplicação em produtos na indústria de alimentos e farmacêutica. A extração da gelatina a partir de pele de Tambaqui demonstrou potencial no aproveitamento minimizando a geração de resíduos, com rendimento de 52,96% em base seca (pele). Além disso, o processo de filtração foi eficiente na remoção de gordura, dando origem a uma gelatina de baixa turbidez. Esses resultados demonstram a obtenção de um produto de boa qualidade e propriedades tecnológicas”, explica o pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste (SP), Manuel Antônio Jacintho.

Ele e outros sete pesquisadores são os autores da pesquisa publicada no Journal of Aquatic Food Product Technology, em fevereiro deste ano. O estudo reforça que a gelatina do Tambaqui é uma alternativa à gelatina comum, geralmente, feita de couro bovino ou suíno. “É utilizado na produção de micropartículas, filmes e hidrogéis, produção de filmes como componentes de embalagens de alimentos, clarificante de bebidas e para produção de cápsulas moles, além de ser fonte de peptídeos bioativos”, detalha Jacintho. 

APLICAÇÕES DA GELATINA DO TAMBAQUI

Produção de micropartículas para incorporação de bioativos

Cápsulas macias de medicamentos

Filmes para sistemas de embalagens

Hidrogéis utilizados para substituição parcial de gordura em alimentos

Fonte: Embrapa Pecuária Sudeste

 

Pesquisa inédita clona gene do hormônio de crescimento do tambaqui

Pesquisadores da Amazônia alcançaram um feito significativo para a piscicultura da região. Em laboratório, eles realizaram, de forma inédita, a clonagem do gene do hormônio de crescimento do tambaqui.

Abreviado pela sigla GH, o hormônio de crescimento é uma proteína que tem forte propriedade anabólica presente em todos os vertebrados. A presença do GH na corrente sanguínea estimula o metabolismo, a proliferação e o crescimento. 

No caso dos peixes, que são animais sensíveis às variações do ambiente, quando estressados reduzem o consumo alimentar e a taxa de produção de GH no organismo. Assim, a administração de GH obtido em laboratório tem impacto positivo sobre a taxa de conversão alimentar, o que representa um aumento na quantidade de carne produzida com menor consumo de ração. 

“Na prática, na piscicultura, a utilização do GH exógeno tem o potencial de impactar positivamente sobre os custos com alimentação, energia e tempo de cultivo, o que proporcionará maiores rendimentos ao piscicultor. Por este motivo, a utilização de GH exógeno pode ser um caminho estratégico como solução biotecnológica capaz de aumentar a produtividade e a sustentabilidade da piscicultura regional e nacional”, explica o professor doutor do Instituto Federal do Amazonas (IFAM), Elson Sadalla, autor principal da pesquisa.

Segundo Sadalla, a clonagem inédita do gene do hormônio de crescimento do tambaqui em laboratório representa a viabilidade necessária para o estabelecimento de uma nova tecnologia voltada para melhorar a produtividade de tambaqui na piscicultura. “Estamos diante de uma fronteira tecnológica a qual pode representar, em termos de produtividade, uma nova fase para a piscicultura do tambaqui. É uma tendência mundial, denominada de Biotecnologia Aquática, onde produtos provenientes dos campos da biologia molecular, engenharia genética e nanotecnologia estão cada vez mais presentes na vida das pisciculturas da região amazônica”.

O professor destaca ainda que o desenvolvimento da piscicultura do tambaqui representa uma busca de progresso econômico e social para as comunidades da floresta. “Com a introdução de nossa biotecnologia na piscicultura teremos um aumento da produtividade e sustentabilidade no setor, o qual poderá ser verificado na redução de resíduos provenientes da ração, já que o GH tem a propriedade de acelerar o metabolismo e a conversão alimentar, redução dos gastos com energia, redução no tempo do ciclo de cultivo e, principalmente, na disponibilidade de um pescado mais barato e acessível a população, produzido com tecnologia mais eficiente e sustentável”, afirma. 

 

Amazônia Viva