Setor elétrico critica uso de caixa bilionário de Itaipu para obras da COP-30 em Belém

Obras na capital paraense, como a reforma do Complexo Ver-o-Peso, se somam a outras despesas já custeadas pela usina binacional

O Liberal
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Especialistas e entidades do setor elétrico criticaram a decisão do governo federal de repassar mais de R$ 1 bilhão do caixa de Itaipu Binacional para obras de infraestrutura urbana em Belém, sede da  30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), em 2025. Para representantes da área de energia ouvidos pela CNN Brasil, a decisão configura uso inadequado das receitas da usina hidrelétrica, além de desperdiçar uma oportunidade de reduzir as contas de luz no país.

A assinatura de convênios no valor de R$ 1,3 bilhão entre Itaipu Binacional, o governo do Pará e a Prefeitura de Belém está marcada para esta segunda-feira (06/05), com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo o Palácio do Planalto, os recursos serão usados na qualificação de vias da capital paraense, no aumento da rede de esgotamento sanitário e na revitalização do complexo em torno do mercado histórico de Ver-o-Peso.

O ex-diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e atual presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Eduardo Barata, diz que o repasse de verbas se trata de um “escândalo”. “Não contestamos a importância dos investimentos que precisam ser feitos, mas é uma usurpação do dinheiro pago pelos consumidores de energia do Sul, Sudeste e Centro-Oeste em suas contas de luz”, declara Barata. Além de abastecer parte do território paraguaio, a energia gerada por Itaipu é direcionada a essas três regiões do país — Norte e Nordeste não recebem eletricidade da usina binacional.

Tarifa poderia ser cortada

A dívida multibilionária para pagar a construção da megausina de Itaipu, com 14 mil megawatts (MW) de potência instalada, caiu drasticamente nos últimos anos. A parcela final foi quitada em fevereiro de 2023 e, desde então, a tarifa da energia gerada em Itaipu poderia ser cortada, uma vez que a hidrelétrica não carrega mais o passivo financeiro. Por outro lado, os gastos socioambientais de Itaipu têm crescido cada vez mais, o que impede uma queda da tarifa.

Tais custos são transferidos para o Brasil e para o Paraguai de maneira proporcional ao consumo: os brasileiros bancam cerca de 85% das despesas (equivalente à energia total que fica no país). “Depois de 50 anos, acabou a dívida de Itaipu. Em vez de a tarifa baixar, criaram novas despesas socioambientais”, criticou Jerson Kelman, ex-diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Itaipu já bancou outros projetos 

No governo Temer (MDB), uma expansão dos projetos bancados por Itaipu passou a incluir melhorias em infraestrutura no estado do Paraná, como: a extensão da pista de pouso e decolagem do aeroporto de Foz do Iguaçu, a duplicação de um trecho da Rodovia das Cataratas (BR-469) e ciclovias em Cascavel. No governo Bolsonaro (PL), foi dado início às obras da segunda ponte internacional Brasil-Paraguai, entre Carmelo Peralta (no Paraguai) e Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul. A ponte terá 1.294 metros de extensão e será bancada por Itaipu, mesmo distante mais de 700 quilômetros da usina. O custo estimado passa dos R$ 500 milhões.

No terceiro mandato de Lula, o programa “Itaipu Mais que Energia” ampliou a área geográfica que pode ser atendida por recursos socioambientais da usina para 434 municípios: 399 no Paraná e 35 no Mato Grosso do Sul. Também foi autorizada a liberação de R$ 600 milhões para a conclusão das obras da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), em Foz, prevista para 2026.

Pelos motivos acima, o orçamento de Itaipu segue pressionado, impossibilitando uma redução das tarifas de energia. Informações contidas nas demonstrações contábeis e no relatório de auditores independentes divulgados pela empresa binacional, os gastos da usina com ações socioambientais no Brasil e no Paraguai tiveram um salto de US$ 505 milhões em 2022 para US$ 921 milhões, em 2023.

Ouvida pela CNN Brasil, uma grande associação do setor elétrico calcula que as tarifas que chegam aos consumidores do Centro-Sul brasileiro poderiam ter redução de 2%, caso as despesas bancadas pelo caixa de Itaipu fossem cortadas. “É vergonhoso”, diz Kelman, ao defender que investimentos semelhantes sejam bancados pelo orçamento público, em vez de custeados por contas de luz, já infladas. De acordo com levantamento recente da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace), o brasileiro compromete cerca de 4,54% de sua geração de riqueza anual com o pagamento da tarifa residencial. 

“Esperávamos um declínio substancial da tarifa de Itaipu com o fim do pagamento da dívida, mas os recursos da usina têm sido usados com fins políticos”, disse Luiz Eduardo Barata. Para Kelman, há “transferência de renda oculta” do dinheiro da hidrelétrica binacional, já que ela não está submetida à fiscalização de órgãos como a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).

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