CARLOS FERREIRA

Jornalista, radialista e sociólogo. Começou a carreira em Castanhal (PA), em 1981, e fluiu para Belém no rádio, impresso e televisão, sempre na área esportiva. É autor do livro "Pisando na Bola", obra de irreverências casuais do jornalismo. Ganhador do prêmio Bola de Ouro (2004) pelo destaque no jornalismo esportivo brasileiro. | ferreiraliberal@yahoo.com.br

O futebol como reflexo de comportamentos da sociedade

Carlos Ferreira

Fingimentos descarados de lesão para atrasar o jogo ou para induzir o árbitro a dar cartão para o adversário, simulações de pênalti, artimanhas de todo tipo para levar vantagem... Os comportamentos desonestos de jogadores em campo, na América do Sul e mais notadamente no Brasil, retratam ou não retratam comportamentos da sociedade? Da mesma forma, na Europa e na Ásia, condutas éticas que para nós brasileiros são surpreendentes, exemplares, também refletem a cultura da sociedade.  

A primeira rodada da atual Série A estabeleceu recorde na história do Campeonato Brasileiro: 74 amarelos e quatro vermelhos para jogadores e outros nove cartões para treinadores ou outros membros de comissões técnicas. Os motivos, na maioria dos casos, foram conduta antidesportiva. O futebol virou vitrine de comportamentos condenáveis, mas ao mesmo tempo serve para reflexão sobre nossas condutas também. Se em matéria de ética a nossa sociedade está doente, o futebol não foge às enfermidades sociais.

Remo em campo, vale tudo pela vitória?

Experimente dizer a um azulino apaixonado que a ética é mais importante que uma vitória do Remo, hoje, sobre o Botafogo, na Paraíba. Claro que o ideal seria uma vitória limpa, com merecimento. Mas a selva desta Série C para o Leão está como selva social em que vivemos, do "vale tudo" pela sobrevivência. As artimanhas podem determinar quem terá e quem não terá o pão do dia seguinte. Estamos numa "metástase" de mazelas sociais que o futebol retrata fielmente.

A sociedade brasileira é fruto de uma construção quase sem ética desde as relações de exploradores com nativos, e o futebol é produto desse meio. O Leão Azul irá à luta, hoje, em João Pessoa, com todas as suas armas, como o adversário também. Veremos, mais uma vez, refletidas em campo as condutas que nos cercam sob a ideia de que os fins justificam os meios. Então, que o Leão urre e seja feliz.

BAIXINHAS

* Sinceramente, condenamos quando a artimanha favorece o nosso time? Admitimos que um atleta diga ao árbitro que não existiu um pênalti já marcado a seu favor? Já ocorreram vários casos assim no mundo. No Brasil, o boliviano Marcelo Moreno chocou o país quando teve uma atitude dessa jogando pelo Cruzeiro.

* Luiz Felipe Scolari conta um fato emblemático que vivenciou como técnico no Japão. O atleta reserva é bem melhor que o titular, mas não admitia tomar a vaga do colega mais velho. Era a cultura do país impedindo a necessária concorrência interna no time. Por essas e outras, o Japão importou tantos técnicos e atletas. Intercâmbio para alguns rompimentos culturais.

* Na Copa do Mundo de 2014, no Brasil, nos surpreendemos com a atitude de torcedores japoneses recolhendo lixo nos estádios. Uma conduta oposta a de torcedores brasileiros que fazem questão de emporcalhar os estádios, como fazem nas ruas e onde moram. Vejam a que ponto o futebol pode render reflexões.
 
* Piscadelas de Júnior Santos (Botafogo) e Deyverson (Cuiabá) flagradas pelas câmeras de televisão, quando "faziam cera" em campo, e a confissão do goleiro do Paysandu, Matheus Nogueira, de que fingiu lesão no jogo contra o Botafogo/SP porque viu o adversário em bom momento, são exemplos da ideia de normalidade para o escárnio.

* Técnicos sul-americanos são quase todos reclamões contra a arbitragem quando se julgam prejudicados. Quem lembra de algum desses técnicos condenando a arbitragem por errar contra o adversário. Qual é o compromisso deles com a ética? A maioria é mentora de posturas desonestas no jogo.

* Exemplo inglês, dos anos 80, contra os hooligans (vândalos), com punição aplicada seriamente aos delinquentes, prova que é possível vencer as gangues travestidas de torcidas organizadas. No Brasil, porém, esses criminosos seguem triunfando. Afinal, como já foi dito, o futebol é tradução da sociedade na qual está inserido.  

* O que pensar de um pai que leva o filho ao estádio e se exibe xingando árbitros, técnicos e atletas com os piores palavrões? E não deve ser difícil para o filho perceber que o pai não se preocupa em ser justo nos julgamentos. Ética zero!

* Técnicos, atletas, dirigentes, imprensa... também se mostram aos filhos dando maus exemplos, sob a ideia equivocada de que o futebol justifica. Pelo contrário, o futebol dissemina exemplos, sejam bons ou ruins. 

* Qual é o mérito da glória sem honra? Pensemos nisso! Entendamos que no futebol ou em qualquer outro setor de atividade podemos viver no ciclo vicioso ou no ciclo virtuoso, que nós construímos ou aderimos. 

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